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O Futuro do Jornalismo

  • Rita Asseiceiro
  • 14 de mai. de 2019
  • 6 min de leitura

O futuro do jornalismo levanta várias questões: se por um lado é indispensável para a manutenção de democracias saudáveis, por outro é cada vez mais difícil garantir a sustentabilidade dos meios de comunicação jornalísticos. Num mundo extremamente ligado aos meios tecnológicos que permitem o acesso rápido e gratuito à informação, ainda não há presente a consciência da responsabilidade civil na perpetuação do trabalho jornalístico e da necessidade de apoiar aqueles que o fazem.


O jornalismo não está em crise apenas em Portugal. A urgência em encontrar um modelo de negócio que garanta que o jornalismo continue a servir as necessidades dos consumidores de forma imparcial e que sustente as necessidades dos meios de comunicação é uma realidade global. Pedro Braumann, diretor do centro histórico e museológico da RTP, é defensor de que o jornalismo não está em crise, que lhe falta apenas um modelo de negócio eficaz. “Ninguém sabe qual vai ser o modelo futuro. Mas sabemos várias coisas sobre o que já aconteceu em termos de mercado. Uma das coisas que sabemos é que o modelo de consumo anterior não vai voltar. As questões ligadas com a Inteligência Artificial e Big Data vão ter um crescimento relativamente relevante”, garante o também professor universitário. Já Manuel Carvalho, diretor do jornal Público, mostra-se um tanto otimista. Confirma que existem casos internacionais que comprovam que o jornalismo ainda tem capacidade para se sustentar. “Começa a haver uma luz ao fundo do túnel e essa luz ao fundo do túnel vem pelo lado das subscrições, das assinaturas digitais”, afirma Manuel Carvalho. A solução passa pela mudança na mentalidade dos cidadãos. Cada vez mais, acrescenta, “eu acho que os próprios leitores começam a aperceber-se que isto que o jornalismo de qualidade é um bem público pelo qual tem de pagar ou devem pagar, porque de alguma forma é um compromisso de cidadania”.


Com o aparecimento de novos modelos de negócio, nomeadamente no meio digital, e com a grande quebra dos lucros publicitários em meios de comunicação social, surgem também novas formas de monetização, nomeadamente o crowdfunding e o branded content. O crowdfunding consiste em doações por parte dos leitores, para que um determinado meio informativo tenha meios para subsistir. O branded content, por sua vez, consiste no patrocínio de determinados artigos, ou seja, o meio de comunicação é patrocinado por um entidade para escrever um determinado artigo.


Manuel Carvalho adotou a estratégia de branded content, mas garante que tenta ser o mais transparente possível aquando do uso da mesma. “Nós tivemos uma ampla discussão com o conselho de redação do Público e encontrámos portanto aqui uma solução que tornámos pública, está no nosso site, todos os nossos leitores sabem o que é que estão a ler quando é um conteúdo patrocinado, quando é um conteúdo comercial ou portanto branded content. No caso do que é o branded content não tem nada a ver connosco, todos esses conteúdos são produzidos sobre a égide de uma empresa do Público chamada studio P que contrata profissionais para fazer esse tipo de conteúdos, nenhum jornalista da redação faz esse tipo de conteúdos”. Ricardo Esteves Ribeiro, co-fundador do Fumaça, opõe-se ao uso de branded content. “Eu não percebo como é que o branded content cabe no conceito de jornalismo. Eu também sei que, provavelmente, se fores falar a empresas em Portugal que fazem jornalismo e lhes perguntares se o branded content é jornalismo eles também te vão dizer que não, mas aquilo está num jornal, ao lado de outras peças de jornalismo”.


Por outro lado, para o jornalista do Fumaça, o crowdfunding é o modelo mais ético de conseguir a monetização dos conteúdos jornalísticos: “O jornalismo deve ter um modelo de sustentabilidade. Eu não gosto nada da palavra negócio, mas deve ter um modelo de sustentabilidade. Isso era o meu sonho. Era o fumaça ser sustentável através das pessoas que nos ouvem e nos seguem. Isso era ético”.


Se para o diretor do Público e para o co-fundador de um primeiros projetos de jornalismo independente, o Fumaça, em Portugal, é importante apostar em novos modelos de negócio, para Francisco Pinto Balsemão, fundador da Impresa, as estratégias para adquirir lucro continuam a assentar em pilares relativamente simples. “É necessário fazer um bom produto, ter bons anunciantes, lutar pelos direitos de autor”, garante o jornalista e empresário que acredita que, mais do que nunca, os bons conteúdos jornalísticos têm relevância no mercado. “Há pressa em dar a notícia e por isso ela aparece muitas vezes mal tratada e incompleta pelas vias mais diferentes que não são jornalísticas, Isso é a prova de que nós jornalistas somos úteis mas que temos de trabalhar de outra maneira. O como e o porquê dos acontecimentos compete cada vez mais ao jornalismo. E o como e o porquê implicam uma certa margem de recuo, implicam uma investigação cuidada, implica uma confirmação de todos os factos, ouvir todas as fontes”, acrescenta Pinto Balsemão.


O papel do jornalista é, então, ainda essencial e, sobretudo, indispensável para uma prática ética e de qualidade. Pelo menos, assim o acha Pedro Norton, antigo gestor da Impresa: “O jornalismo não se faz sem jornalistas. Jornalistas bons, de idades diferentes, uns com mais experiência, outros com mais garra, um equilíbrio saudável. Eu não tenho dúvida nenhuma que sim”. Já Vera Moutinho defende que “falar com uma pessoa tem tanta coisa envolvida, a empatia, a comunicação não verbal, acho que nunca vai aniquilar nem sequer a importância em si do papel do jornalista”.


Manuel Carvalho sustenta a mesma doutrina, defendendo que nunca a máquina poderá substituir o homem neste sentido: “Uma escrita fria, mecânica, matemática pode ser bom para a erudição académica mas não é bom para a emoção do jornalismo. A escrita jornalística implica sensibilidade, implica uma capacidade de nós percebermos o valor das coisas e gerarmos uma certa empatia com elas, com elas e com os destinatários daquilo que nós escrevemos”. Apesar disso, o cabecilha do jornal Público acredita que “o número de vagas disponíveis para os jovens licenciados em comunicação social vão reduzir” e que o futuro possa residir em “pequenos projetos”.


Ricardo Esteves Ribeiro, co-fundador do Fumaça, orgulha-se do seu “pequeno projeto jornalístico” online. No fumaça não há preocupação de dar a notícia em primeira mão, sendo que é publicado cerca de um artigo por semana. O objetivo principal é ouvir pessoas que normalmente não são ouvidas, contar histórias que não são contadas pela maioria dos meios de comunicação social. Ricardo não descarta, no entanto, o trabalho realizado pelos meios de comunicação tradicionais: “Nunca pensei que o Fumaça iria substituir o trabalho que o Público, o Diário de Notícias fazem. Se houver uma bomba que caía aqui no largo Camões, alguém tem que dizer que isso aconteceu e não vamos ser nós. Nós nunca conseguiríamos existir se os outros jornais não fizessem o seu trabalho porque tiramos muita coisa de lá. Provavelmente, eles também não conseguiriam existir se não existisse jornalismo de investigação, que cada vez é mais escasso nesses jornais. Se o futuro passa por nicho? Eu acho que tem que passar mais por isso, porque em Portugal não há isso”.


Manuel Carvalho sustenta a mesma ideia, acreditando que “há algum futuro em pequenos projetos, há algum futuro em jornalismos de nicho, direcionados para gostos específicos, para pequenas comunidades. O jornalismo local acho que tem um grande futuro”.


Aqueles que contactam diariamente e profissionalmente com o jornalismo acreditam, então, que o jornalismo não pode e não vai acabar, que o papel do jornalista é essencial para que se mantenham regimes democráticos saudáveis e para que se dê informação de forma humana, emotiva. Pedro Norton considera que o futuro do jornalismo passa pela mão de todas as pessoas: “Todos nós temos uma responsabilidade individual para salvar o jornalismo. Eu ficarei muito preocupado de imaginar um país , um mundo sem jornalismo, em que os poderes políticos, por um lado, não são escrutinados por bom jornalismo, em que não há um debate livre de ideias”. Os modelos de negócios sustentáveis são conquistáveis mas ainda há trabalho a desenvolver. Quanto ao modelo futuro do suporte jornalístico, as opiniões divergem.


Manuel Carvalho, enquanto diretor do jornal “Público”, acredita que “o futuro é claramente jornalismo digital”. Ironicamente, a coordenadora multimédia do mesmo jornal, Vera Moutinho, discorda: “ O jornalismo digital tem sempre essa natureza intrínseca que há sempre uma coisa nova que aparece e que desaparece também muito rapidamente ou não ou que vinga durante algum tempo. A tecnologia nunca foi o principal e acho que a tecnologia por si não é jornalismo”.


As opiniões da mesa de especialistas divergem no que toca a modelos de negócio e até quanto ao que está reservado para futuros suportes de monetização e de informação. Todos concordam, no entanto, que o jornalismo não entrará em extinção devido ao importante contributo que exerce na opinião pública e na manutenção de democracias vigorosas e favoráveis. Francisco Pinto Balsemão conclui que apenas “temos todos de nos proteger um pouco dessa tentação permanente de andar pela superfície e não aprofundar e o bom jornalismo ajuda a aprofundar”.


Reportagem de Inês Messias e Rita Asseiceiro

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